A Cemig inicia nesta sexta-feira (14) a abertura programada das comportas da usina de Três Marias, onde a represa atingiu o maior nível em quase 40 anos devido às chuvas recentes. Existe um temor de que, com a liberação das águas, seja atingido o centenário barco a vapor Benjamim Guimarães, que está próximo à margem, na altura de Pirapora, no Norte de Minas Gerais. Patrimônio histórico estadual, a embarcação é o último barco movido a lenha do mundo.
Como a obra de restauração da embarcação está paralisada, o casco ainda não foi refeito, o que significa que existe risco de que as águas do São Francisco danifiquem ainda mais o Benjamim Guimarães – ou até o destruam, se o volume for maior do que o esperado.
No início desta semana, após a chegada de um grande volume de água do rio Abaeté, o rio São Francisco transbordou, e as águas chegaram a alcançar o casco do vapor, mas ainda sem prejuízos. Na quarta-feira (12), a água começou a descer.
O prefeito de Pirapora, Alex Cesar (PTB), esteve em Belo Horizonte nesta semana para tentar negociar com diferentes órgãos ligados a patrimônio para que as obras sejam retomadas rapidamente. Ao perceber que o nível do rio iria subir consideravelmente, ele já havia solicitado ao Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG) permissão para realizar ações emergenciais.
Com apoio do órgão, a prefeitura instalou escoras para evitar deslocamentos laterais da embarcação, realizou intervenções no casco no para permitir a passagem da água e evitar flutuação irregular e fez um reforço do cercamento no perímetro da embarcação, com o objetivo de reduzir a velocidade da água.
O principal objetivo agora é evitar que o barco tombe, o que poderia danificá-lo de forma definitiva. “Nosso cuidado é manter o barco estável, para que ele não se movimente, se vier um volume maior de água. Mas podem ocorrer prejuízos, sim. A embarcação está sendo restaurada e o primeiro convés tem equipamentos que foram substituídos de valores bastante elevados, como geradores e a casa de máquinas. Porém, tudo isso é recuperável. O fundamental é garantir a estabilidade”, explicou o prefeito.
Segundo ele, a abertura programada das comportas – com volumes gradativos que vão de 500 a 2.000 metros cúbicos por segundo, ao longo de quatro dias – não deve provocar uma elevação tão grande no volume do rio São Francisco. A situação sairá do controle se o volume do rio Abaeté, que desagua no São Francisco, subir de novo. “Ele tem que estar com uma vazão de 500 a mil metros cúbicos por segundo, para que Três Marias possa soltar com tranquilidade uma vazão maior”. Felizmente, não há previsão de chuvas intensas na região central de Minas nos próximos dias.
Segundo a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), “mantidas as condições de vazão negociadas junto à Cemig, não haverá danos ou risco de destruição deste bem cultural”.
Impasses atrapalham restauração
A situação não seria tão dramática se a restauração do barco tivesse ocorrido conforme o planejamento. O Benjamim Guimarães deixou de navegar em 2015, por questões de segurança. Em 2019, foi assinado convênio entre Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), responsável pelos recursos, e Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), encarregado pela contratação e execução da obra, orçada em R$ 3,7 milhões.
A licitação foi vencida pela Indústria Naval Catarinense. Após o primeiro repasse do Iphan, em 2021, o órgão fez questionamentos ao projeto, o que parou pagamentos e obra, segundo uma fonte que preferiu ter o nome preservado.
Mesmo com as respostas do Iepha-MG, houve impasse entre os órgãos, e o Ministério Público de Minas tentou intermediar a negociação em setembro de 2021. Ainda há necessidade de aditamento do contrato, acrescentando R$ 1,5 milhão ao orçamento, segundo a fonte.
A restauração foi iniciada em 2020, segundo a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), com primeiro repasse no início do ano passado. Foi necessário suspender a obra temporariamente, para realizar ajustes técnicos e administrativos.
A secretaria informou que tanto o Iepha-MG quanto o Iphan vêm “envidando esforços para a continuidade do convênio e finalização das obras” e que a previsão de retomada da restauração é para o primeiro trimestre de 2022.
Para o deputado estadual André Quintão (PT), que acompanha o caso, faltou ao órgão federal sensibilidade para entender a importância histórica, cultural e turística do vapor. “É preciso levar esse debate para um escalão maior (…), mostrar a importância dessa preservação”.
Procurado, o Iphan não tinha respondido até o fechamento desta edição.
Confira a nota da Secult, na íntegra, sobre a situação do Benjamim Guimarães:
“Além das tratativas realizadas entre Iepha-MG e CEMIG para controle das vazões, o Governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo, do Corpo de Bombeiros de MG, e em parceria com a Marinha do Brasil e a Prefeitura de Pirapora, atua em plano de emergência para proteção do Vapor Benjamim Guimarães, em virtude das cheias do São Francisco.
Dentre as ações executadas pela Prefeitura de Pirapora, realizadas com orientação e acompanhamento do Iepha-MG, estão a instalação de escoras para evitar deslocamentos laterais da embarcação, intervenções no casco no para permitir a passagem da água e evitar flutuação irregular, e reforço do cercamento no perímetro da embarcação, com o objetivo de reduzir a velocidade da água.
A previsão de retomada das obras é para o primeiro trimestre de 2022 e, mantidas as condições de vazão negociadas junto à CEMIG, não haverá danos ou risco de destruição deste bem cultural.
A restauração do Vapor Benjamim Guimarães é fruto de convênio celebrado entre o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, responsável pelo repasse de recursos, e o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – Iepha-MG, encarregado pela contratação e execução da obra.
O projeto foi aprovado pelas duas instituições no ano de 2019 e a obra iniciada em 2020. O primeiro repasse financeiro realizado pelo Iphan ocorreu no início de 2021 e foi utilizado no pagamento dos gastos iniciais dos serviços contratados pelo Iepha. Contudo, no princípio de 2021, os repasses cessaram para ajustes técnicos e administrativos entre as instituições. Com isso, foi necessário suspender a obra temporariamente.
Tanto o Iepha-MG quanto o Iphan vêm envidando esforços para a continuidade do convênio e finalização das obras. Neste momento, toda a atenção se dirige às ações emergenciais em decorrência das chuvas que atingiram a região e provocaram elevação do rio São Francisco para além do esperado”.
Via O Tempo// Adaptado do Notícias da Lapa
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