Governo quer acabar com desoneração da cesta básica e compensar mais pobres com dinheiro

Na avaliação de técnicos do Ministério da Economia, a reoneração garantiria garantiria uma economia de R$1,2 bi por ano Foto: Lucíola Vilella / Agência O Globo

Na avaliação de técnicos do Ministério da Economia, a reoneração garantiria garantiria uma economia de R$1,2 bi por ano Foto: Lucíola Vilella / Agência O Globo

BRASÍLIA - O governo quer acabar totalmente com a desoneração da cesta básica e substituir o benefício por uma devolução direta de dinheiro a famílias mais pobres . Em entrevista ao GLOBO, Vanessa Rahal Canado, assessora especial do ministro da Economia, Paulo Guedes , disse que a medida fará parte da primeira etapa da reforma tributária que deverá ser enviada ao Congresso ainda este ano.       
Desde 2004, produtos como feijão, arroz, pão, leite e queijos são isentos da cobrança do PIS/Cofins. Nos últimos anos, uma série de decretos ampliou o rol de itens beneficiados pela alíquota zero e, na avaliação de especialistas e técnicos do Ministério da Economia, passou a englobar alimentos consumidos por famílias mais ricas.
Em setembro, um estudo do Ministério da Economia propôs voltar a cobrar imposto sobre a venda de alguns produtos da lista , como queijos, iogurte e determinados tipos de queijo. A ideia era obter cerca de R$ 1 bilhão para direcionar os recursos para reforçar o Orçamento do Bolsa Família.
A proposta que será enviada ao Congresso, no entanto, será mais abrangente. Nenhum item receberá a isenção. Em vez disso, famílias de baixa renda terão direito a receber dinheiro de volta.
O objetivo é criar uma política social mais eficiente e, para isso, extinguir totalmente o programa. Hoje, o governo deixa de arrecadar cerca de R$ 18 bilhões por ano com a desoneração da cesta básica.
- Desonerar parcialmente a cesta básica é um movimento que, depois de um tempo, volta ao status quo. Mesmo que você enxugue, daqui a um tempo muitas coisas ‘básicas’ surgem e aumentam essa conta. Esse é um caminho, mas não é o ideal. O cenário ideal para melhorar a regressividade do imposto é a devolução (de dinheiro), independentemente do que as pessoas consomem - explica Vanessa, que também é secretária-executiva do Grupo de Trabalho para Aperfeiçoamento do Sistema Tributário.
No novo sistema, o consumidor vai gerar créditos no cartão do Bolsa Família ao comprar produtos sobre os quais incidem PIS/Cofins. O valor pago em imposto será devolvido, de acordo com a faixa de renda.
A ideia é garantir que beneficiários do Bolsa Família tenham uma restituição de 100%. Será criado um sistema para quem não tem o cartão.

Segundo Vanessa, o modelo permitirá que o governo acompanhe se o dinheiro público está realmente sendo revertido em benefício social e não está sendo embolsado pelas empresas.
— Não tem como saber se, quando se dá uma isenção sobre o pão, ele ficou mais barato. Não tem como controlar. Nesse mecanismo da devolução, eu tenho (como controlar) — afirma.
A reoneração da cesta básica fará parte do projeto de lei que unificará PIS e Cofins. A equipe técnica espera terminar o texto nos próximos dias, mas o envio ao Legislativo dependerá do ambiente político.
A proposta de fusão dos tributos enfrenta resistência, principalmente do setor de serviços, que sairia perdendo com a mudança. Isso ocorreria porque hoje a maioria das empresas do segmento recolhe PIS e Cofins por um regime no qual a alíquota é de 3,65%, sem possibilidade de abater o que foi gasto ao longo da cadeia de produção. O novo imposto deve ter alíquota de ao menos 11%, porém com possibilidades de abatimentos.

O setor de serviços teria perdas porque praticamente não compra insumos, portanto teria poucas despesas para abater e pagar menos impostos. Segundo Vanessa, a equipe estuda formas de mitigar essas perdas:
— Dependendo do setor, se ele é socialmente sensível, como, por exemplo, talvez saúde e educação, a melhor maneira seja a isenção. Agora, se não é um setor socialmente sensível, talvez a melhor maneira seja uma alíquota de transição. Uma carga menor no começo até chegar a uma carga regular no final. O grande problema é que qualquer exceção que você vá fazer, a alíquota regular tende a aumentar. Realmente, é um equilíbrio difícil.

As próximas etapas da reforma ainda estão em aberto. Para o Imposto de Renda, o foco será fazer uma espécie de faxina, com revisão de deduções. O governo também quer reduzir a tributação sobre empresas e passar a taxar dividendos.
A medida é uma das ações para reduzir a chamada pejotização, quando empregados são contratados como pessoas jurídicas e pagam alíquota menor de Imposto de Renda.

Uma vez feita essa reestruturação do IR, Vanessa não descarta uma revisão das alíquotas do imposto, incluindo uma tributação adicional sobre faixas mais altas do salário. Com o sistema atual, no entanto, ela alerta que o efeito seria nulo.

— (Uma nova faixa de tributação) é uma variável dentro da reforma do IR, não dá para desprezar, mas realmente não está decidido. Hoje, você tem muitas brechas e muitas maneiras diferentes de se organizar para ganhar sua renda. Não adianta simplesmente aumentar uma faixa da tabela progressiva, se as pessoas fogem da tabela progressiva pela pejotização, por exemplo. Então, não adianta muito falar: vou tributar os ricos em 35%. Os ricos não pagam imposto na tabela progressiva. Tem que tomar um pouco de cuidado. As variáveis estão na mesa, mas a gente tem que ter um objetivo claro — afirma. O Globo.